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domingo, 22 de maio de 2011

O Pêndulo

As sociedades, principalmente as mais impreparadas, funcionam muitas vezes de forma pendular.

Passa-se de um extremo ao outro de forma inesperada e rápida.

Recordo-me na minha adolescência de ouvir o meu Pai que apoiara Norton de Matos e Humberto Delgado no tempo da ditadura e que durante o PREC se insurgiu contra os abusos da revolução descrever com clareza a situação de quem mantinha alguma continuidade de pensamento.

Explicava ele: eu mantenho-me no mesmo sítio, eis se não quando ouço um estremecer e vem a multidão que passa por mim em direcção à direita e lá chegados apontam-me o dedo gritando "comunista, comunista". De repente dá-se uma reviravolta e lá vêem eles outra vez na minha direcção, desvairados, passam por mim em direcção à esquerda e gritam furiosamente "fascista" "fascista". Bom ... eu estive sempre no mesmo sítio.

Isto a propósito da disciplina nas escolas. Ainda haverá em muitos sítios indisciplina mas noutros o pêndulo já virou e virou de uma forma muito feia.

Extremados, professores que ainda têm vivas memórias de desautorização, enchem o peito como Ataturk, escolhem alvos que estigmatizam como indisciplinados, perseguem-nos em todos os detalhes, baixam-lhes as notas nos testes e depois voltam a baixá-las no fim dos períodos, exibem uma paixão assolapada por estabelecer castigos exemplares, são incapazes de reconhecer qualquer mudança positiva, incapazes de estabelecer estratégias diferenciadas para miúdos diferenciados.

Miúdos que fazem testes para 18 têm 16 nas correcções e 13 no fim do período. Outros, yes-man, que copiam por eles nos testes em que mereceriam 10 e passam a merecer 13, têm 15 nos testes e 17 no fim do período. Nas reuniões de pais estes exigem saber os nomes dos "meninos irrequietos" para julgamentos populares e os professores estão dispostos a dá-los.

Atiram para a valeta miúdos com alma que enchem de faltas disciplinares incompreensíveis, a quem nunca dão uma chance para mudar e, quando se lhes pergunta qual o pior exemplo do seu comportamento,  não sabem dizer mais do que "é irrequieto",  "falador", "não faz os exercícios", o caderno "está desorganizado", será "hiperactivo"?

Os poucos professores, às vezes os mais velhos, que percebem o que se passa, têm medo nos Conselhos de Turma e calam-se.

Pobre país e pobre geração que verá substituída a indisciplina e o desrespeito de um sistema confuso, cobarde e cheio de clichês, por um sistema sem alma, histeriforme, intolerante quanto à diferença e cheio de clichês.

Voltando ao meu Pai, de que vale numa passagem de modelos o design da passadeira, o cenário, a luz,   a música serem fantásticas se as roupas forem trapos feios e as raparigas camafeus? De que vale um bom urbanismo com uma má arquitectura, um bom argumento com actores tão maus?

Depois contacta-se um colégio estrangeiro e choca o contraste. 

Uma coisa é o desenvolvimento, outra a sua imitação.

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