Uma boa parte da indignação da imprensa francesa (e da portuguesa) em relação à prisão de Strauss-Kahn tem a ver com o significado cultural de algemar uma pessoa.
Na cultura americana isso é um procedimento rotineiro de segurança. É como ser transportado num carro da polícia. Na cultura europeia é uma humilhação. Não vale a pena prolongar esse debate muito tempo. As mesmas imagens despertam sentimentos diferentes em comunidades diferentes.
Outra diferença cultural é que o debate que se ouve em França sobre o carácter fogoso do Sr. que aparentemente gostará muito de mulheres - isto a propósito de uma caso de violação - é ofensivo até em Portugal, sendo totalmente incompreensível para um americano. Hoje um conhecido comentador televisivo português tentou vender a agressão sexual do Sr. como "assédio" e afirmava, seguro, ser incompreensível que um violador pudesse ser considerado um perigoso criminoso, pudesse constituir perigo para a comunidade ou pudesse sequer fugir. Imagino o que se dirá em França.
Há contudo duas outras coisas que não podem deixar de ser observadas.
A primeira tem a ver com o facto de nos Estados Unidos o tratamento reservado pela justiça ser muito mais igualitário do que acontece na Europa, em que quem não é ninguém é tratado de uma forma e quem é poderoso é tratado de outra. Chama-se a isso estado de direito.
O segundo tem a ver com a eficácia da justiça. Fomos expostos recentemente a dois casos de justiça penal - um envolvendo um modelo português e agora este. Em ambos a eficácia do sistema judicial Norte Americano está a léguas do que nós cá temos.
Cá o Sr. nunca teria sido activamente procurado lá porque uma mulher da limpeza, guineense, o acusava (uma escritora francesa filha de um militante socialista em 2002 não teve condições para se queixar do Sr. e tem sido desde essa data perseguida por ter sequer levantado a hipótese de fazer queixa); se o procurassem seria em câmara lenta e nunca o apanhariam dentro do avião; se o apanhassem seria sempre tratado como um VIP e rapidamente libertado; tudo o que dissesse à policia ou ao procurador não valeria nada em julgamento dando-lhe tempo para inventar uma narrativa alternativa em combinação com o seu advogado (a verdade pode dizer-se expontaneamente; para mentir é preciso treinar); o julgamento ocorreria dentro de anos e a vítima seria humilhada repetidamente como vimos no Caso Casa Pia em Portugal; autoridades e forças políticas conspirariam incansavelmente contra a justiça e talvez falsificassem provas e as introduzissem por mão amiga no processo; uma imprensa servil estaria disposta a tudo; a vítima seria alvo de tentativas de suborno e/ou ameaçada; quem defendesse a vítima seria demonizado e processado sem vergonha; os advogados das vítimas, polícias e magistrados manteriam low profile enquanto os advogados de defesa seriam estrelas televisivas diárias; inventar-se-ia uma teoria da cabala e o suposto agressor retomaria uma carreira política fogosa.
Os branqueadores do Sr. seriam sempre muito bem tratados e nunca confrontados publicamente mesmo por quem achasse que o Sr. era um criminoso, pois "toda" a gente acha normal ser-se amigo de um putativo criminoso se ele tiver poder.
Ora tudo isto nos Estados Unidos parece bem mais difícil.
Fica-se com a impressão que cá nestas matérias não há relação entre o que se diz e o que se faz. Lá parece haver.
P.S. no título não é por engano que justiça "portuguesa" aparece em minúsculas.
P.S. no título não é por engano que justiça "portuguesa" aparece em minúsculas.
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